quinta-feira, 8 de julho de 2010


"Me dá um real, tio?". Foi o que ele me disse após a foto. É o destino das crianças que vivem na rua. Entregues à mendicância, são obrigadas a viver e sobreviver em um mundo diferente do que realmente devia ser. Ou não. Talvez seja o mesmo mundo. Talvez seja um mundo de cabeça pra baixo.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010


Se for pra chover, que caia uma tempestade. E quando o sol brilhar, que ofusque os olhos que se abrirem e aqueça o que se há de aquecer. Se for pra amar, que seja loucamente. Se for pra sofrer, que seja perdidamente. E que a tristeza se faça ausente em uma explosão de felicidade. Que venha um milhão de amigos e ser mais forte e poder cantar. Cantar até faltar a voz. Correr até faltar o ar. Pular até rasgar o céu. Me entregar a tudo que for entregue. E escrever sorrisos freneticamente como se houvesse acabado de nascer. Renascer. Dançar todos os ritmos, ouvir todas as músicas, ler todos os livros. Quero os perfumes, os sabores e as memórias. Quero lembrar como se tivesse acabado de viver e viver como se nunca fosse lembrar. Quero o calor, o frio na barriga e a flor da pele. Quero a sabedoria e a tolice, a paz e a guerra, os beijos e abraços e tudo em dobro. E que o sempre esteja presente até mais um recomeço.

Intensidade. É tudo que eu quero em 2010(cobrir).
Um brinde.

segunda-feira, 11 de maio de 2009


Pulou. Lançou-se em queda livre submerso em um nada de vento e adrenalina. Nos derradeiros segundos que se seguiram, sua mente oscilou entre pensamentos aterrorizantes e nostálgicos, enquanto seu corpo rompia desesperadamente o ar. Por incrível que pareça, faltou-lhe o ar. Os olhos abertos, incapazes de enxergar um palmo a distância do turbilhão de cores que borravam o seu fim. A boca seca, incapaz de produzir qualquer som que sobressaísse o de sua morte. Estava próxima. Estava próximo. Pensou em tudo que viveu. Havia vivido? Tudo tornara-se somente lembranças e, em alguns segundos, até as lembranças deixariam de existir. Logo, pensou em tudo que não viveu. Como havia perdido tempo no ermo de sua solidão; como jogara fora as oportunidades; como não amara; como não sorrira; como não correra; como não havia se entregado aos seus instintos quando eles pulsavam em seu peito, nem lutado por suas verdades; como não havia buscado pelo novo quando diziam para fazê-lo. Poderia voltar? Olhou para trás e viu uma vida inteira de lacunas abertas sob um céu azul imenso. Olhou para frente e tudo entrou em foco, o fim tornou-se visível. Um temor repentino tomou conta de si. Era agora. Fechou os olhos, pensou uma última vez. Um baque surdo silenciou-o e então não viu mais nada.

domingo, 24 de agosto de 2008


A rotina perseguia Roberto como um cão persegue um gato. Acordava todo santo dia às 7:03 da manhã. Sentava, hesitava, levantava. Seu banho durava exatos vinte minutos, e fechava a torneira sempre com a mão direita. A gravata só era posta após o café-da-manhã, duas fatias de pão torrado e uma caneca pela metade de café. Antes de sair para o trabalho dava uma olhadela no quarto do filho, batia a porta e entrava no carro.


Roberto seguia sempre pela mesma avenida, olhando sempre à frente, com a mesma velocidade sempre. Ouvia sempre a mesma rádio, parava sempre nos mesmos semáforos, tamborilava sempre com dois dedos o volante do carro, e remexia sempre o porta-luvas, desinteressado. Balançava a cabeça para o velho de estacionamento, e dirigia-se pra mesma vaga de sempre, a qual não sabia sequer o número. Cumprimentava os colegas, a secretária, e se enclausurava no escritório, até o final do dia, quando todo o percurso seria metódica e inversamente refeito.


Era aparente para todos a estranheza do comportamento de Roberto. Uns diziam que ele não passava de um detalhista psicótico e obsessivo. Outros diziam que Roberto havia enlouquecido com a morte da mulher. Mas a verdade é que Roberto não era louco, e muito menos um detalhista psicótico e obsessivo. Agia de tal forma involuntariamente, alheio a qualquer sentimento e a qualquer noção de realidade. De fato não era louco.


Certo dia, Roberto acordou às 7:10. Levantou-se rapidamente e se apressou no banho para recuperar o tempo perdido. Uma das torradas acabou torrando demais e Roberto foi obrigado a comer apenas uma fatia de pão. No carro, notou que a avenida que sempre seguia tinha um parque, com uma grama verde e pássaros. Perguntava-se como não havia reparado antes. Percebeu como o velho do estacionamento tinha um rosto simpático e como os seus olhos azuis brilhavam. E que todas as pessoas respondiam ao seu bom-dia. Reparou como sua secretária sabia combinar os tons de roupas. E como era bela a vista do seu escritório. O seu azul brilhava.


Naquele dia Roberto se sentiu mais feliz.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Sobre os sonhos

Há algo de surreal nos sonhos, sejam estes dos mais simples aos mais complexos. Todas as pessoas têm um sonho, por pior que sejam os sonhos ou por pior que sejam as pessoas, pois é dado um momento em que cada um deseja se desligar de sua realidade, ou, simplesmente, vêem nos sonhos a única forma de atingir um plano de vida que não conseguiram atingir.

Os bebês, por mais que não tenham conhecimento algum da vida, de alguma forma sonham com ela. Talvez os sonhos se resumam a imagens distorcidas de um mundo que não conhecem. Ou simplesmente sonham com as cores. As cores e seus movimentos, o que faz de seus sonhos algo agradavelmente puro. Quando criança, os sonhos variam. Aqueles mais preocupados com o futuro sonham em ser médicos, jogadores de futebol, veterinários. Outros sonham em conhecer o papai Noel, que a escola acabe logo ou que completem o álbum de figurinhas. As cores tomam forma, desvendando os traços da personalidade de cada um.

Na adolescência, os hormônios mexem com os sonhos e os sonhos mexem com os adolescentes. Os sonhos passam, então, a ser divididos entre os meninos e as meninas. As meninas sonham em ter um momento com o garoto que tanto gostam, sonham em ter um namorado e logo planos de uma vida eterna já são feitos. Os meninos sonham com videogames, carros e programas de computador. Ambos sonham com seus 18 anos, com a independência, com a aproximação de suas escolhas, se desligar dos pais e viver sua vida.

Com a maturidade, os sonhos focam-se na família e na carreira. Ser um profissional renomado, bem sucedido, com um carro e uma casa espaçosa, ganhar dinheiro e poder sustentar a família da melhor forma. Quando isso não se torna possível, a única solução aparente é sonhar com os números da megasena. Na velhice, os sonhos passam a ser mais modestos, mais tenros, mais sinceros: um fim de vida feliz, tranqüilo, aconchegante e simples.

O único problema dos sonhos, em bebês, crianças, jovens, adultos ou velhos, é que de repente se pode acordar.

sábado, 5 de julho de 2008

Meias, moletons e edredons... O inverno nunca foi tão frio. E com todo esse frio, me peguei lembrando de quando eu era pequeno. Lembro que eu dormia em um berço, com um travesseiro pequeno e um lençol azul escuro. Havia outros lençóis, mas o azul escuro, em especial, ficou registrado na minha mente. Era azul como um céu à noite, salpicado de pontos brancos e com heróis lutando no espaço. Lembro que quando chegava o inverno, minha mãe cobria o berço com um lençol grosso que o fazia parecer uma cabana. Daí eu ficava ali deitado, olhando pro teto da cabana e imaginando as figuras se movimentando, com a imaginação de criança. Até adormecer. E nada penetrava aquela estufa. Nada, exceto uma mão segurando uma mamadeira com um mingau quente e doce, era quando eu percebia que já era de manhã. E não precisava de ninguém, só daquilo, pra aquecer todo aquele inverno.

terça-feira, 17 de junho de 2008


É sempre assim. A casa enche. Irmãos, cunhados, cunhadas, parentes. É muita conversa, muita risada, muita festa, sô. Um gostinho de feriado prolongado misturado com amendoim. Um gostinho de animação misturado com o milho assado na fogueira. Ah!, a fogueira! As bandeirolas, o colorido, o barulho do vento batendo nelas. O rodopiar da fumaça subindo no ar como um balão. A liberdade de um balão subindo no ar como fumaça. Os fogos de artifício. As quadrilhas sincronizadas batendo os pés no chão, as palmas no ar, as roupas farfalhando. O colorido. O gostinho do frio misturado com o bolo de aipim.

A mesa, repleta de tudo. De tudo que é felicidade. Luz, cores, música. É festa na rua, é festa em casa. O gostinho de alegria misturado com o beiju quentinho. É descanso, é cansaço. É acordar tarde com as pessoas caminhando pela casa, falando com satisfação. O gostinho da satisfação misturado com canjica. É esquecer de tudo e esperar. É ser feliz. Ah, é sempre assim.

Boas festas juninas à todos.